sábado, 19 de abril de 2014


© susana sobrado, lisboa, 2014





Considero que venci esta sensação vaga e assustadora que tinha dentro de mim. A vida é realmente difícil, uma luta de minuto a minuto, mas a luta é sedutora. Antigamente via um futuro caótico pela frente, porque eu não queria viver o momento que estava à frente do meu nariz. Queria que tudo me fosse oferecido, como uma criança muito mimada. Às vezes tinha a certeza, embora fosse uma sensação vaga, de que no futuro «poderia vir a ser alguém», de que poderia vir a fazer algo de «espantoso»; e outras vezes aparecia-me novamente o medo caótico de que «no fim estaria perdida». Começo a entender por que é que isso acontecia. Recusava-me a cumprir as obrigações óbvias que tinha pela frente, recusava-me a ir ao encontro do futuro, degrau a degrau. E agora, agora que cada minuto é pleno, cheio de vida e experiência e luta e vitória e depressão, seguido de imediato por mais luta e por vezes sossego, agora deixei de pensar no futuro, quer dizer, é-me indiferente se mais tarde vou realizar algo de espantoso ou não, porque algures no meu íntimo estou certa de que alguma coisa há-de sair. Antigamente vivia continuamente num estado preparatório, tinha a impressão de que tudo o que fazia não era a «sério», mas sim a preparação para algo diferente, algo «grande», a sério. Mas agora deixei-me totalmente disso. Agora, hoje, neste minuto, vivo e vivo plenamente, e a vida é digna de ser vivida.

Etty Hillesium, Diário (21, Março, 1941, às 8h30)


(para ti, Rafa)








sábado, 8 de junho de 2013

sexta-feira, 31 de maio de 2013



© rafa, paris, 2013





(...) Pudesse eu ser tu
E em tua saudade ser a minha própria espera.

Mas eu deito-me em teu leito
Quando apenas queria dormir em ti.

...
E sonho-te
Quando ansiava ser um sonho teu.

(...)

Mia Couto in "idades cidades divindades"




segunda-feira, 8 de abril de 2013




© ssobrado, lisboa, 2013





(...) ele sabe para onde vai. cada rua. ele caminha.
nas ruas distantes que tem dentro de si.
eu vejo perder-se. (...)

José Luís Peixoto, in 'A Casa, a Escuridão'






sábado, 2 de março de 2013



© rafa, paris, 2013
 
 
Para onde quer que fores, vai todo, leva junto teu coração.


 Confúcio
 
 
 




 
 
 
 

sábado, 16 de fevereiro de 2013


 
© rafa, samouco, 2011
 


Multipliquei-me, para me sentir,
Para me sentir, precisei sentir tudo,
Transbordei, não fiz senão extravasar-me,
Despi-me, entreguei-me,
E há em cada canto da minha alma um altar a um deus diferente.

Fernando Pessoa


sábado, 26 de janeiro de 2013


© ssobrado, porto, 2012



Só assim entenderemos que da «discussão» quase nunca nasça a «luz», porque a luz que nascer é normalmente a de duas pedras que se chocam. Da discussão não nasce a luz, porque a luz a nascer seria a que iluminasse a obscuridade de nós, a profundeza das nossas sombras profundas.

Vergílio Ferreira, in 'Invocação ao Meu Corpo'